segunda-feira, 9 de março de 2009

Amarga comemoração

Desculpe se agora o assunto toca "no que todos preferem nao falar", ou nao pensar. Mas coloquei abaixo o texto de Claudio Lembo que faz um reflexao sobre o caso da menina de 9 anos engravidada pelo padastro, em que a igreja catolica excomungou os médicos que realizaram a interrupçao da gravidez.

O assunto da violencia sexual contra a criança, no Brasil e no mundo esta nos mostrando o quanto essa sociedade é doente. O que fazer para cura-la? Começa-se por nao fechar os olhos para essa violencia. A hipocrisia protege o agressor, e vemos muito que a sociedade tende à fazer isso e a igreja também. O primeiro passo para proteger uma criança que passou por isso é reconhece-la como vitima e admitir que ela sofreu uma violencia. Negar a situaçao com medo da vergonha é proteger nao so esse mas todos os abusadores de crianças que sempre existiu. Temos que refletir sobre as possiveis origens de comportamentos como esse dentro de cada um para entender o que esta acontecendo com a sociedade. Como por exemplo questionar esse exagerado culto ao fisico, ao qual as mulheres se submetem assumindo o papel que quer dar-lhe a sociedade: nao mais do que um objeto sexual.

Que as verdades sejam ditas e que os inocentes sintam-se protegidos e defendidos, para que essas pessoas se envergonhem de utilizarem-se dos mais fracos para satisfazer as suas promiscuidades. Atitudes como essa da igreja so pioram as coisas, impondo uma outra violencia, a de portar um filho ja oriundo de um ato nao consentido, sem possuir a menor estrutura fisica e psicologica para tal. A igreja faz o que a sociedade faz também, culpar a mulher, por existir, por ser a "origem do pecado", uma vez que homens como esse nao conseguem controlar o seu lado animalesco. Um pergunta: a igreja propoz a excomunhao do agressor??? Entao, a igreja proteje o agressor e age com essa crueldade contra a criança? Qual o problema da igreja contra as mulheres?

Bref... às vezes preferiria nao saber de coisas como essa...

Amarga comemoração

Cláudio Lembo
De São Paulo (SP)

"Os meios de comunicação trazem ao conhecimento da sociedade episódios que, antes, ficavam escondidos no interior dos mais variados segmentos, algumas vezes sem voz e sem identidade.

Sempre aconteceram práticas de violência contra as crianças. Por toda a parte. A moderna literatura escancara episódios de forma amarga e inaceitável.

Em todos os tempos, o incesto e a promiscuidade estiveram presentes em determinados situações. Algumas vezes escondidos pela imensa pobreza e outras pela excessiva opulência.

Em ambas as hipóteses, configuram-se - o incesto e a promiscuidade - como enfermidades graves de ordem psicológica. Quase sempre indicam vontade de posse contra o mais fraco.

Nada mais abominável. Agredir moral e fisicamente uma criança é ato indigno. Merece forte e grave repúdio. Nem sempre, contudo, é assim. Por vezes, motivos díspares afastam uma análise crítica da atitude do adulto.

Ainda agora, toma-se conhecimento de cena degradante. Um padrasto abusou durante longo tempo de sua enteada, menina com apenas nove anos de idade.

Uma criança. Apenas uma criança. No entanto, na sua tenra idade, usada sexualmente, engravida. Uma tragédia de incomensurável dor. Um sentimento de vergonha invade as consciências.

Nenhuma palavra ergueu-se contra o agressor. A hierarquia religiosa romana apenas execrou o ato de equipe médica que, autorizada pela Justiça e pela mãe da menor, afastou a gravidez.

Médico e sua equipe foram excomungados, isto é, excluídos da comunidade religiosa à qual pertencem. Aplicou-se a mais grave das censuras canônicas.

Nada de processo legal. A pena foi aplicada sem qualquer conhecimento dos acusados. A vontade exclusiva da autoridade. Um fundamentalismo excessivo.

Muitas as variáveis presentes. Uma menor indefesa. Um homem rude e sem escala de valores. Uma equipe médica autorizada a romper gravidez indevida. Uma autoridade religiosa de visão dogmática.

No centro da polêmica uma mulher, ainda criança. Aqui, ainda um traço dramático. Tudo ocorreu nos dias que antecederam a data internacional das mulheres.

A coincidência mostra como ainda não existe na sociedade contemporânea, apesar dos avanços, vontade de preservar a mulher em sua fragilidade física. Manter seu corpo inviolável, sem seu expresso consentimento.

Há um machismo milenar nas consciências masculinas. Este ainda coloca a mulher, muitas vezes, como mero objeto, sem consciência e vontade própria.

Pode ser agredida. Se a agressão conduzir ao uso não autorizado de seu útero, nada há a fazer. Aconteceu. Ponto e basta. Sofra a mulher todas as conseqüências de sua condição feminina.

Um absurdo. A situação da mulher necessita ser repensada e reexaminada dentro dos cânones de uma sociedade que procurou oferecer igualdade entre os sexos.

Falsa igualdade, como se constata no amargo episódio da menina de nove anos. Ela, por ser mulher, deve suportar todos os ônus de sua feminilidade. Ser agredida. Portar a gravidez fruto da concupiscência masculina e adulta.

A preservação da atual visão da figura da mulher merece ser revista. Já não se admite ver a mulher como na Idade Média, quando milhares foram sacrificados nas fogueiras inquisitoriais.

Não possuíam culpas individuais. Muitas foram vítimas da luxúria masculina. Esta perdoada pelos mais fúteis motivos. É tempo de repensar a tragédia humana.

Se existe uma verdadeira intenção de tornar a mulher companheira da travessia, torna-se necessário recompor a forma de vê-la e compreender sua fragilidade face à brutalidade da vida contemporânea.

É tempo de mudar. No futuro dia oito de março, lá em 2010, espera-se a verificação de avanços. Autoridades civis e as hierarquias religiosas precisam abandonar velhas condutas.

Na vida há situações e situações. Cada uma com peculariedades próprias. Em cada situação, torna-se necessário um exame de seu perfil. Jogar todas em um mesmo cânone é praticar o pecado da omissão."

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