sexta-feira, 28 de setembro de 2007

A expediçao ao abismo Le Berger - França



O abismo Berger é considerado o mais belo abismo dos Alpes franceses, situa-se no Vercors, uma regiao montanhosa e com alta pluviosidade, onde nos profundos maciços calcareos bastante carstificados situam-se varias grutas verticais que foram cenarios de importantes exploraçoes na historia da espeleologia francesa.

Ele foi o abismo mais profundo do mundo de 1954 à 1963. As suas primeiras exploraçoes foram realizadas por Joseph Berger, que o descobriu em 1953, além de Ferdnand Petzl, Jean Cadoux, Clause Arnauld entre varios outros, normalmente membros do Espeleo Grupo de Grenoble.

Varias expediçoes foram realizadas nos anos 1954 à 1956, sendo que em 1954, numa expediçao que durou 6 dias na gruta, alcançaram a profundidade de -712m, e dois meses depois à -903m. Em 1955 avançaram até a profundidade de -935m. Em 1956 foi realizada uma grande expediçao, sendo precedida por uma pre-expediçao, onde 218 mochilas com equipamentos foram transportadas ao abismo e em seguida, numa grande expediçao que durou 16 dias, alcançaram a profundidade de -1.112m e a realizaçao de imagens para um filme. Em 1963 foram realiazados mergulhos no sifao final. Em 1968, B. Léger e S. Dubois passam os dois sifoes do fundo e atingiram a profundidade de -1.141m, em que foram explorados 600 novos metros de galerias em 10 horas de exploraçao realizadas apos a passagem do sifao.

A visitaçao do abismo é proibida durante a estaçao umida, que vai de outubro à maio, mas o risco de cheia é uma ameaça constante. Em algumas passagens a vazao alcança valores incrivelmente altos, como 30m3/s como vazao de pico. No mapa da gruta encontram-se indicaçoes sobre os possiveis pontos de refugio dentro da gruta, para proteger-se das inundaçoes. Em 1979 dois espeleologos foram surpreendidos por uma violenta cheia com ventos de tornado, durante a subida de uns dos ultimos lances de corda, à -80m da saida. Eles compunham uma equipe de 4, sendo que os 2 primeiros conseguiram sair do abismo antes e voltaram para Grenoble, os outros 2 atrasaram para subir por causa de problemas com o equipamento de iluminaçao de um deles causados pelo excesso de umidade. Os dois morreram de hiportemia e foram encontrados dias apos, presos à corda, no mesmo lance vertical, separados por um fracionamento.

As quedas também foram causas de varias mortes, seja por problemas com o material, como o rompimento de cordas, ou por falha humana, à partir de erros ocorridas durante a manipulaçao dos equipamentos durante o percursos verticais e passagem des fracionamentos. O excesso de cansaço devido às horas à fio de atividade na gruta, agravados pelo frio e a umidade intensos do ambiente, podem conduzir os espeleologos à uma dificuldade em concentrar-se, quando ficam sonolentos e dispersos. Considerando-se que durante a passagem de fracionamentos uma manipulaçao mal feita pode ser fatal.

Em 1996 uma forte cheia ocorreu no abismo durante uma expediçao mista entre ingleses e hungaros, e levou ao falecimento dois membros da equipe no mesmo momento, em pontos distintos do abismo. No grande canion, à perto de -800m de profundidade, a agua subiu subitamente e um membro da equipe nao conseguiu se desprender à tempo da corda e sair do canal e continuou preso pelo longe durante a passagem das aguas. Apesar dos esforços do colega hungaro, a espeleologa nao resistiu, pois ela nao estava equipada com um macacao de neoprene ou de latex (pontonnière). A primeira parte da equipe que estava mais à frente, à poucos instantes antes, foram surpreendidos por essa cheia na cachoeira do P27 (poço 27). Os dois primeiros conseguiram subir, mas o terceiro faleceu preso ao fracionamento em plena cheia. Os dois que haviam subido passam dois dias esperando baixar as aguas, em meio às goticulas e depois decidiram descer e esperar na parte inferior desse trecho, abrigados abaixo da cachoeira, na tentativa de proteger-se das aguas. Eles fixaram uma corda ao lado do companheiro morto. O resgate dos corpos terminou uma semana depois da ocorrencia dos acidentes. Essa foi a mais forte cheia ocorrida no Vercors em 1996.

Enfim, agora falando da minha participaçao à uma expediçao à esse abismo! O primeiro passo é ter conciencia da decisao tomada, ou tomar a decisao de participar de uma expediçoa como esta com conciencia dos riscos e da sua propria capacidade (fisica, técnica e psicologica), principalmente apos saber de todos esses relatos, a segunda coisa é refletir sobre o fato que os dois primeiros à subir normalmente se salvam... Mera coincidencia? Bom, finalmente, falando seriamente, a expediçao estava prevista com bastante antecedencia, na verdade desde o começo deste ano. Pois é necessario que o grupo demande uma autorizaçao junto aos orgaos governamentais ambientais franceses para acessar o abismo. Ele nao é ascessivel sem autorizaçao previamente concedida. Havia 4 grupos envolvidos na organizaçao da expediçao, todos eles do sul da França, sendo um de Nimês e os outros de Montpellier. A organizaçao demanda alguma dedicaçao, é preciso que a equipe possua um numero consideravel de componentes para possibilitar o transporte de todas as mochilas com os equipamentos e cordas necessarios para a equipagem dos lances verticais. E também para a divisao das equipes que irao equipar e desequipar diferentes partes do abismo.

Estando no Vercors na sexta à noite, sabado de manha partimos em direçao ao abismo, que é precedido por um caminhada de 1 hora e meia. A equipe que desceu no sabado era composta por perto de 25 membros, sendo 4 mulheres. A primeira equipe, que ira à uma profundidade maior do que a que eu planejava atingir, havia ja descido, mais cedo e equipado os primeiros trechos. Todos os membros masculinos da equipe portavam 2 kits (kit=mochila/saco de espeleo), os membros femininos portavam somente 1, evidentemente. Logo no inicio da gruta, encontramos uma sequencia de descidas, onde 11 poços de 17 a 37 metros, se encadeiam. O que faz que o começo da expediçao seja altamente prazerosa e agradavel, à nao ser pele lembraça que tudo devera ser subido depois.

O abismo é bem equipado, os spits velhos sao aparentemente regularmente observados e trocados. Um dos trechos mais tensos e delicados sao duas passagens horizontais, com média de 200 metros de comprimento, em um meandro profundo (visivilidade para baixo de aproximademente 8m), mal ou nao equipado e super escorregadio. Esses foi um dos trechos que mais me preocupou, pela facilidade de escorregar em direçao à esses 8 metros onde a parede se estreita e ficar entalado la em baixo. O local foi motivo de reclamaçao entre varios outros espeleologos, inclusive o chefe da comissao de espeleo-resgate do departamento Hérault, que estava na equipe.

Apos toda a sequencia de verticais, acessamos o rio em um grande salao. À partir dai a descida é feita caminhando, o sobe e desce de blocos abatidos, até a parada no “point chaud” (ponto quente), pouco antes da sala dos treze, onde fizemos uma pausa para o lanche e uma bebida quente. A parada foi rapida, em torno de 20 minutos, pois é la que sentimos a baixa temperatura da gruta. Na retomada da caminhada passamos pela esplendida sala dos treze! O volume do salao, as estalagmites em volta dos lagos e as represas de travertinos, que foram bem mostrados à partir das fotos de Jean-Jacques, sao verdadeiramente magnificos!

O trajeto ainda incluia trechos de verticais, mais espaçados entre eles, e escaladas acrobaticas para evitar-se o contato com a agua congelante, especialmente para uma brasileira do cerrado.

Fui até as proximidades do salao do vestiario, onde as pessoas se trocam para, à partir dai, progredirem na gruta dentro da agua, onde começa os canions. Aproveitei a companhia de alguns que ja começavam o trajeto de retorno e comecei a subida ruma ao melhor da viagem: sair da gruta!!!!

Foi obviamente a parte mais longa e dolorida da viagem. E como é longa!!! Entrar num lance de corda, se debater no começo para fazer os meus dois neuronios coordenarem os movimentos do patan, juntamente com os outros ascenssores, estar esperto para nao fazer besteiras nos fracionamentos e gritar: “libreeeee!!!” na saida da corda. Parecia nao ter fim... Eu estava cansada e com fome, pensava que se conseguisse sair eu nunca mais faria novamente isso, e que ia vender meus equipamentos de espeleo, queria estar em lugar aconchegante vendo um filme na televisao. Quando nao pensava, reclamava, os outros espeleologos me consolavam dizendo que isso acontece à eles todas as vezes, que eles se prometem nunca mais voltar, mas que o prazer na espeleo vem 15 dias depois! E o sofrimento a gente esquece depois... e acabamos voltando!

Apos o ultimo lance de corda, enfim a superficie! Eu senti uma sensaçao de alivio tao grande por ter saido que o meu corpo relaxou completamente, como se a caminhada ja tivesse acabado, mas nao ainda, faltavam as duas horas morro acima até chegar ao carro. Quando fui caminhando à passos curtos, duas ou tres vezes me deitei no chao para tentar um cochilo, mas os outros me motivavam a continuar, eu insistia: “cinc minutes...”. No total foram 17 horas de atividade.

No fim o balanço que tenho é que no geral a espeleologia francesa é muito dificil em comparaçoa à espeleo que fazemos normalmente no Brasil. O frio, as inclinaçoes, os desniveis, a exposiçao, sao enormemente maiores. Aqui o ambiente espeleologico é ainda mais dominado pelos homens e é mais machista do que no Brasil. Nao tem muito jovens que praticam e ainda menos mulheres.

Por ter sido algo muito além da minha experiencia, fui cautelosa e humilde, sem querer me forçar à explorar além dos meus limites, que em uma situaçao como essa eu nem sabia quais eram. Pois apesar de adorar a espeleologia mas também adoro a vida!!! E o prazer vem realmente depois, e se alguém se animou em comprar os meus equipamentos de espeleo, pode esquecer, ja mudei de idéia.

Da proxima vez sera mais ligth!! Vou falar de cozinha e colocar umas receitas!

Bisocas!

quinta-feira, 27 de setembro de 2007

1 ano de França!!!












um ano

Hoje em dia

Vou estrear as minhas primeiras linhas nesse blog aproveitando o assunto do aniversario de 1 ano na França!!!!

exatamente 1 ano atrás, chegava aqui, em Montpellier, com duas malas bem pesadas, sendo que me desfiz de quase todas as minhas coisas que não vieram! Afinal estava chegando para ficar por quatro anos!! O que é "uma vida"!!!

Deixava o Brasil controlando a tristeza de me afastar das pessoas queridas, da família e dos amigos, mas sabendo que tinha fechado um ciclo do que vivi no Brasil, em Brasília. Os meus pais ja estao acostumados com a filha aventureira que vive arrumando encrenca mundo afora! Infelizmente ainda os ajudo a embranquecer os cabelos! Os -650m de profundidade descidos no abismo que o diga!!

Não sabia muito o que me esperava, mas estava empolgada e curiosa com as mudanças. Em meio aos milhares de papéis que devia providenciar, e que os franceses adoram, encontrar um lugar para morar e pensar em deixa-lo habitável, os novos amigos, os problemas de comunicação e as dificuldades com o idioma, o frio que começava a chegar...

Estar sozinho no contexto de Montpellier é menos dolorido. Pois no vemos nos outros, nos vários jovens, estudantes, pesquisadores, franceses ou estrangeiros, que estão aqui por motivos semelhantes, seguindo suas carreiras e buscando preparo profissional. Muitos com os mesmos tipos de problemas, sejam limitações financeiras, longe da família, abertos para novas amizades. São pessoas jovens ou jovens de espíritos, coloridas, diferentes, as meninas cheias de acessórios e maquiagem, não querem ser iguais e não tem medo de serem julgados pela ousadia do visual. Acabamos também ficando mais relaxados aqui, após sair de um pais onde a ditadura da beleza criada pela televisão faz verdadeiras prisioneiras da aparência.

Mas enfim, nem tudo são flores, como nos disseram quando chegamos aqui, os primeiros 3 meses são de lua-de-mel, depois vem a realidade! Como não somos turistas, o encanto vai-se uma hora, e temos que encarar a vida real, pois não é o nosso pais, estamos longe das pessoas que nos amam, e o inverno, uma hora o bicho pega!!!

E foi nesse momento que veio talvez o melhor beneficio de uma experiência dessas: o crescimento! Não tem outra, não adianta chorar porque a mamãe ta longe e não vai ouvir!!! Ai vem a lição de aprender a estar bem com você mesmo, faça chuva ou faça sol e aprender que a vida é feita de saborear os momentos que temos! E desfrutar de tudo que ela nos oferece! é por isso que conclui que ser feliz é uma escolha.

E quando isso acontece, nos damos conta da quantidade de coisas boas e ficamos cada vez mais contentes e começamos a irradiar isso! E ai as pessoas vem, aos montes! Pois todos querem compartilhar o que é bom!

Bom, um ano de França, e afinal, e a tese? ça va!!! A tese esta indo bem, obrigada! apesar de que às vezes não sei se sou engenheira/hidróloga ou escritora de ficção cientifica em francês (a tese). O trabalho so vai aumentado, assim como a pressão, e a coisa vai ficar cada vez mais apertada! Mas essa é a idéia, infelizmente, pois uma tese não fica pronta assim tão facilmente sem umas gotas de suor e sangue.

Bom, vou encerrando, já escrevi muitas besteiras.

Depois escrevo mais!

Bisous